olhó robot


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Este robot faz-me lembrar as tardes de infância a ver televisão. Tenho saudades dos anos 80, do Adam Curry e do Nino na RTP2, da miratécnica antes de começar a programação, das pastilhas Gorila e dos gelados Fá. De gravar músicas em K7s, das calças Lois e dos casacos de fato-de-treino dos meus irmãos, do cubo mágico e de jogar às escondidas na minha rua. Há dias comprei uns ténis Sanjo.





Ao que ele lhe respondeu:

- Gosto de ti agora.




foto de nan goldin


lembranças


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Esculpi, com um canivete e à minha maneira
Um pequeno e tosco barco de corcódea
Onde uma formiga destemida faz de marinheira
E, caindo à água, pede misericórdia...

Com quatro bugalhos e um pauzito
Fiz novos passageiros para a embarcação
Um homem barrigudo e um porquito
Que enfrentaram a corrente com emoção!


marcas d'água


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- Algumas estátuas guardam as marcas da chuva como se fossem rios de lágrimas...
- Não sejas pateta, as estátuas não choram!
- É precisamente por causa de todo o sal que choraram que se tornaram estátuas...
- Não te sentes observado?



[Sinto-me honrada quando a qualidade dos comentários ultrapassa a "qualidade" dos posts. Por isso, tomei a liberdade de pegar nas palavras de quem comentou o último post, e criei uma história, um texto, o que lhe quiserem chamar, com algumas adaptações que, espero, não levem a mal. Obrigada Naked, Gatafunha, Jazz manel, Lisboeta, Rantanplan, a. e AG, pela emotividade das vossas palavras. A quem conheço, um beijo especial e, a quem não conheço, um abraço amigo (um sorriso especial para o a., pela fantástica história que aqui partilhou).]



Quando se corta uma veia poética a poesia espalha-se?

(Não me apetece falar de morte)

- Só pensando na morte se consegue realmente viver...

A primeira vez que fui ao Cemitério dos Prazeres tinha 12 anos. Era miúdo do Barreiro mas vim estudar para Lisboa (apanhava o barco às 6h30). Detesto flores de plástico, pior que isso só bonecas de porcelana!

- Todas as flores neste cemitério são de plástico. Só assim se atinge a eternidade.

Fumei os meus primeiros cigarros e o primeiro charro. E, fora da escola, aprendi - à custa de algumas quedas, arranhões e uma lesão a sério - a apanhar eléctricos em andamento. Um deles - não sei se já era o 28 - vinha da Graça, passava perto da escola e ia para o Cemitério dos Prazeres.

- Sabes, uma das coisas mais bonitas em Veneza é o cemitério onde está sepultado Wagner.

... era um palacete antigo, lindíssimo, com tinta verde a estalar nas paredes...

"Morreu do coração no auge da fama, em Veneza, e foi sepultado num túmulo por ele próprio preparado, em terrenos de sua casa, em Bayreuth."

Vinha com uma colega da mesma idade, a Lurdes, que esteve muitas vezes para ser minha namorada e nunca foi...

"Na vida nada se perde, tudo se transforma."

Fumámos sentados nas campas, lemos os nomes dos mortos e tentámos decifrar o significado dos epitáfios. Havia um cipreste maior do que os outros. E um jazigo com anjos...

"Horas, horas sem fim,
pesadas, fundas,
esperarei por ti
até que todas as coisas sejam mudas.

Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça."
Eugénio de Andrade

E havia muito vento vindo de Alcântara e do rio.


sombras


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Os nossos passos são o silêncio dos rostos perdidos.

Quero flores de plástico na minha campa, quando morrer.

Levarei comigo os sorrisos prometidos

Para uma eternidade vã, de rendas a envelhecer.



cemitério dos prazeres, lisboa




valerie in the mirror, nan goldin



Lá por casa sempre houve mais motas e máquinas que bonecas e vestidos.



Ainda bem.


23


transparência


levitação



Abaixo o cif e o sonasol.
Pela liberdade de expressão!


porta de casa-de-banho, numa escola qualquer


caminhadas


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Há caminhos que se fazem mais rapidamente que outros.

Gosto das paisagens urbanas, sim, e depois? A cidade vicia. A degradação. os vidros partidos. A sujidade das ruas. Gosto, sim. As pessoas decadentes e os cães a condizer. As ruínas, o abandono.

Não há só nuvens e céu azul. Não há só paz e verde. Há uma paisagem mais humana e dolorosa que todas as outras, que sangra, que ecoa pelos meus braços.

Gosto da decadência.

Da mulher velha e mal-cheirosa que dorme na arcada no meio de sacos. Do maluco que estende a mão e lava os dentes na poça de água.

Percorro-vos, delicio-me na vossa miséria.



Gosto dos caminhos que ninguém faz por medo. Dos malucos sentados a rir das formigas, sufocados no seu próprio cuspo.

Gosto de paredes a escorrer solidão.

Dos putos perdidos de olhar vazio. Da tristeza dos passos que, dia após dia, vão ficando para trás.

Gosto da demência.

Das putas de cabelo descolorado e decotes indiscretos. Dos taxistas libidinosos com erecções escondidas.

Há encontros reflectidos na podridão dos degraus.

Há uma cidade vagabunda que seduz.

De uma beleza crua e doentia.

Domina-me.





Os ouvidos são sempre os mesmos. Mesmo que a música por vezes pareça diferente.



Gosto-te.


Igreja da Madalena, Baixa de Lisboa

Tudo o resto são sardinhas assadas, caracóis e imperiais ao pôr-do-sol, caminhadas por uma cidade reinventada, manhãs de sol na relva, discos riscados, insectos improváveis, o meu licor beirão e o teu moscatel, o rio do lado de cá e do lado de lá, Santiago a penantes e a costa alentejana de bina, os torresmos de Santa Filomena, fotografias desfocadas e às cores, o Camões, o Cais do Sodré e as taínhas, uma chave, o zumbido dos carros, a Almirante Reis às 2 ou 3 da manhã, o gajo a mijar e a dizer boa-noite, os copos no Suave, um concerto com erva no bolso, os paus de canela, os cabelos ao vento, as paredes de stencil, as caixinhas de metal da feira da ladra, o homem que toca sempre a mesma música pausada como quem não sabe, o mármore, um eléctrico que vai e outro que vem, a fama de Alfama, a escrita a escorrer pelos dedos partidos.

Tudo o resto é simples.


seres alados


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foto de jn

não temas
não chores
porque quando cais
do ninho
haverá uma mão
haverá um sorriso
que te afaga as penas
que te dá a tranquilidade
que precisas
te leva até à relva
até às árvores
onde o céu é azul
e as minhocas
mais gordas
onde aprendes a voar
novamente
e deixas de ter medo.


flutuações


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subo com o rio nas veias. chamo-te. jazz experimentalista. a voz das flores e dos bichinhos de conta. adidas. con-cep-tu-a-li-za-ções. luz vermelha. picante às escuras. licores. blondie. paredes salpicadas de cartazes e sentidos. espirais. libelinhas a esvoaçar no peito. café.





Todo o tempo livre que tenho é para viver de forma improvável.



Os passos trazem-me a tranquilidade de uma imperial ao final do dia. O sentido encontra-se num prato de moelas a fumegar. E molho. E pão.




Não me sai da cabeça "O Cão Andaluz".


#


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Objectos sobrepostos e a solidão da caneta já vazia de letras cansada de escrever as vozes que pairam no ser que repousa atrás dos outros olhares que sentem mas não falam antes do som metálico das ideias soltas nas páginas em branco angustiantes e sujas de palavras vãs que marcam as mãos sem sentido óbvio ou aparentemente incerto nos telhados das casas e nas subidas do corpo inválido de todos os dias que estão parados e zangados nas curvas da escrita.



Ou talvez não.


superfícies


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Mármore. Sardinha assada. Imperial.

Formigas. Toalha aos quadrados. Mazzagran.

Andorinhas. Escova de dentes. Ondulação.





(alma cheia de)