escreve as tuas cartas*


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Hoje é o último dia da minha vida. Não percebo como cheguei aqui e não tenho rigorosamente nada a dizer ao mundo. Que diferença fez a minha passagem pelas ruas, que pessoas toquei ao longo dos meus passos? Vou morrer amanhã, sei-o. E tudo o que sou não passa de uma mera folha em branco, uma folha que espera em vão ser manchada com o sangue das palavras. Repouso os olhos nas minhas mãos e não as reconheço como minhas. Não vejo os caminhos que percorri, as lágrimas que criei, os risos que partilhei, nenhuma das emoções que agarrei com os dentes. Tudo o que fiz, em vão. As nuvens continuarão a galgar, errantes, o azul do céu. O Sol nascerá dia após dia, a chuva regar-me-á. Misturo-me no pós do esquecimento antes da carne ganhar o gosto a terra. As linhas que sulcam a pele nada têm para me dizer. Há cartas que nunca poderão ser escritas sem que nos asfixiem a alma. Negros são os meus pensamentos. Negros sãos os homens. Vazio. Escrever é morrer aos poucos.

*Frase de “Brisa de Mudança” [The Wind That Shakes the Barley], filme de Ken Loach. As cartas são a despedida para as pessoas que amamos quando a hora da morte se aproxima.


3 reacções a “escreve as tuas cartas*”

  1. Anonymous Anónimo 

    Há que tentar fazer com que as nossas vidas nao acabem com este pensamento.

    Mas sempre ficarão coisas por fazer....e muitas, ou seja o presente é o tempo correcto.

  2. Anonymous Anónimo 

    Penso ter detectado duas gralhas neste texto - «Misturo-me no "pós" do esquecimento» e «Negros "sãos" os homens» - que são, na minha modesta opinião, dois «actos falhados» lindíssimos. Deixe-as ficar, às gralhas, aqueles passarocos que pousam onde não são chamados mas têm sempre uma razão oculta para pousar... Com respeito, e cada vez maior admiração pelo seu blog (o conto a quatro mãos lá em baixo, a meias com MPR, está uma maravilha),

  3. Anonymous Anónimo 

    pedra no charco: sim, ficarão sempre coisas por fazer, mas é bom que não nos prendamos ao que deixamos de fazer e nos dediquemos àquilo que podemos fazer...

    a.: de facto, detectei essas duas gralhas, mas depreendi que o leitor inteligente (como assumo que são todos os meus leitores) perceberiam esses meus pequenos deslizes :) provavelmente é o subconsciente a fazer poesia por conta própria... Quanto ao conto a 4 mãos com o MPR, começou de forma inesperada, mas está a ter um belo desenvolvimento. Conto hoje acrescentar um ponto :)

palavras soltas

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