Pegaste em mim e
Com uma tesoura afiada, cortaste o cordão
Que me sustentava
E alimentava.
Vindimaste-me
No sopro de uma aragem
E esmagaste-me entre as mãos
Deixando o suco escorrer
Por ti abaixo.
Devoraste-me bago a bago,
Entre risos de maldade e satisfação.
Vieste-me por entre os sucos
Do prazer de me teres esmagado.
A vindima este ano foi boa.
Mas teme-se que o vinho não preste.
Está impregnado de mim.
E da tua luxúria.
Nas noites em que os ruídos
Me perturbam os pensamentos
Julgo sentir tudo lá fora
Parado. Desaparecido.
Quieto demais.
E receio sair do que conheço
Para ver que o mundo parou
E as pessoas não mais existem.
Nas noites em que temo
Não voltar a ver o brilho do sol
Acredito que a manhã não o será
Que o astro deixará de vir
Roçar a minha janela
E alimentar a cor da minha pele.
Nas noites minhas
Invento histórias que me iludam
Dos meus temores
Mais sombrios.
Dos pensamentos mais frios
E do desejo de te ter aqui, para me abraçar
E confortar.
Porque éramos meninos fortes
Um para o outro.